Felicidade: teorias positivas vs. teorias negativas

Lucas Favaro
4 min readApr 10, 2023

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Teorias positivas da felicidade

A maioria das pessoas pensam que a felicidade é alcançada mediante a conquista de objetivos:

  • Se você conseguir aquele emprego que você tanto almeja, então você será feliz;
  • Se você conseguir se relacionar com a pessoa que você deseja, então você será feliz;
  • Se você conseguir comprar aquele carro que você tantou sonhou, então você será feliz;
  • Se você ganhar na mega-sena, então você será feliz.

A felicidade, segundo essa ideia, estaria relacionada à conquista de objetivos: se você conquistar x, então você será feliz. Podemos chamar teorias que orbitam esse tipo de ideia de teorias positivas da felicidade. Positivas pois elas pregam que a felicidade só pode ser alcançada mediamente a positivação* de um desejo.

*Um dos significados de positivar é, segundo o dicionário do Google/Oxford Languages é “tornar(-se) positivo, real, concreto; concretizar”.

Uma conclusão quase que necessária dessas teorias é que a felicidade é uma miragem. Você luta, batalha, se mata para conquistar algo — mas tão logo esse algo é conquistado, você já se sente afligido por outro desconforto e já se sente infeliz por não conseguir superar tal desconforto.

Isso porque o ser humano (e todos os demais animais) sempre procura sair de um estado de maior desconforto para um estado de menor desconforto. Em termos econômicos — como um economista, sempre penso nesses termos — , as preferências humanas possuem a propriedade de não-saciedade: é impossível alcançarmos o ponto de blissfulness completa e eterna, de inação absoluta.

Assim é a vida: uma luta constante contra o desconforto, contra a entropia; em última instância, contra a morte.

Só que se você condicionar a sua felicidade à ausência de desconforto, e adicionar a isso o fato da não-saciedade das preferências, o corolário que se segue é que você nunca será uma alma feliz.

Teorias negativas da felicidade

Em contrapartida a essas dismal theories acima esboçadas sobre a felicidade, há também certas teorias a respeito da felicidade que dizem o seguinte: você não precisa conquistar nada para ser feliz, basta mudar a sua maneira de encarar a vida.

Podemos chamar teorias da felicidade que se baseiam nesse tipo de ideia de teorias negativas da felicidade. Negativas pois elas não pregam o requerimento de nenhum fator externo para o alcance da felicidade. Pregam puramente uma mudança na forma pela qual você enxerga o mundo — uma mudança de framing.

Veja que essas teorias não pregam necessariamente a necessidade de ausência de desconforto (o blissfulness total, o ponto de saciedade absoluta) para o alcance da felicidade. Pregam apenas que não são os seus desejos e desconfortos, ou ausência deles, que irão determinar a sua felicidade. Então o que é que determina a felicidade? Para muitas dessas teorias, é a experiência do momento presente; para outras, a sensação de gratidão perante a vida; para outras, a auto-reflexão; e assim por diante.

Tais ideias não são substitutas, mas sim complementares: a auto-reflexão só é alcançada mediante o foco no momento presente; a sensação de gratidão perante a vida é, em certa medida, um ato de auto-reflexão; e assim por diante.

Essa mudança de framing na forma de enxergar o mundo acaba fazendo você perceber que os seus objetivos materiais/mundanos são tão pequenos in the grand scheme of things. Faz, finalmente, você ficar com a mente menos conturbada e, portanto, menos desconfortável. Logo, mais feliz.

Qual dos tipos de teoria está mais próxima das evidências?

Estudos sobre felicidade existem aos montes, e várias evidências do que torna as pessoas felizes se acumularam ao longo dos anos.

Um resultado forte nas pesquisas sobre felicidade é o seguinte: experiências, e não coisas, tornam as pessoas felizes. Outro resultado claro dessas pesquisas é o de que relações interpessoais saudáveis são o principal determinante para uma vida feliz. Ainda outro é o de que aspirações extrínsecas (sucesso financeiro, aparência atraente, reconhecimento social) levam a um menor bem-estar, ao passo que aspirações intrínsecas (autoaceitação, afiliação, sentimento comunitário e saúde física) levam a uma sensação de maior bem-estar.

Tais resultados parecem estar alinhados (senão 100%, próximo disso) com as teorias negativas da felicidade. De fato parece ser o caso de que a forma como você aborda o mundo, e não as condições externas próprias ao mundo, é o que irá fazer você ser mais ou menos feliz ao longo da sua vida.

Conclusão

Este texto foi uma tentativa minha de fazer um esboço de uma taxonomia das teorias da felicidade. De forma alguma ele é um texto auto-contido, pois apenas arranha a superfície de teorias filosóficas e psicológicas a respeito do bem-estar da mente humana.

Apenas quis mostrar, no texto, que o senso-comum fortemente arraigado na mente de muitos de que a felicidade é alcançada mediante coisas externas — principalmente se essas coisas forem de fato coisas (casa, carro, etc.) — está completamente em desacordo tanto com as teorias filosóficas milenares a respeito da felicidade quanto com as pesquisas científicas mais modernas.

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Lucas Favaro

Entusiasta do transumanismo, do altruísmo eficaz e do globalismo.